sexta-feira, 2 de abril de 2010

A Travessia de Aqueronte



Há momentos da vida que não temos outra saída a não ser fazer a tão temida "travessia de Aqueronte", tão aterrorizantemente descrita por Dante, na Divina Comédia.


Tal qual Virgílio, sou levada pelo desumano servo Caronte pelo rio que conduz ao "inferno" de mim mesma, aqui e agora, sem precisar morrer para estar na barca.


A hora de resgatar outros passados se aproxima rapidamente. Inevitável esse ajuste de contas, aceito por mim antes de desembarcar "nesta estação". Acordo inicial, cujo cumprimento já está em execução, sendo agora, a parte mais difícel de ser adimplida.

Cérberus persegue-me com seu feroz olhar, ávido para destrorçar-me. Cabeças e serpentes bailam hipnoticamente, como se quisessem desviar-me do caminho, devorando-me o juízo.

Tenho medo, quero retroceder mais já não posso. Os portais fecharam-se e só me resta enfrentar a "passagem".


quarta-feira, 31 de março de 2010

Dica de leitura para a Páscoa


As identidades assassinas - Amin Maalouf
Nesta época em que comemora-se a "ressurreição" de Cristo, crucificado e morto em razão das "ideias" que pregava, essa leitura vem a calhar.
O livro é uma éspecie de levante, um protesto, um grito de indignação contra a "loucura" (política de ocasião, oportunista), doença mesmo, daqueles que matam e incitam outros a matarem em nome de uma "identidade".
O Autor, escritor e jornalista, apoiado na sua própria condição de homem do oriente (nasceu e cresceu no Líbano) e do ocidente (vive desde os 27 anos na França), tenta compreender o porque, na história da humanidade, a afirmação de si próprio tem que passar pela negação do outro e sua completa extinção.
Ao final da leitura, extrai-se uma poderosa mensagem de tolerância e alteridade, bem apropriada para tempos de "Páscoa", passagem, transformação e renascimento.
Do autor recomendo, ainda, as seguintes obras: Um mundo sem regras, Os Jardins de Luz, O amor de longe, As cruzadas vistas pelos árabes.

terça-feira, 30 de março de 2010

Orientar e não punir.....coesão e não coerção


"Porque é o nosso olhar que aprisiona muitas vezes os outros nas suas pertenças mais estreitas e também é o nosso olhar que tem o poder de libertá-los". Amin Malouf




A sociedade é formada pelo conjunto das relações sociais: as coercitivas, cuja particularidade é impor do exterior, ao indivíduo, um sistema de regras com um conteúdo obrigatório; e as relações de cooperação, cuja essência é fazer nascer no indivíduo a consciência dos princípios ideais que comandam todas as regras, no sentido de se obter a coesão social, uma das mais legítimas expressões da realização da justiça. A lógica contenciosa deixa de ser o único caminho para fazer valer o direito, pois só uma decisão baseada no consenso poderá ser considerada justa.

Uma comunidade coesa pressupõe a co-responsabilidade de seus membros pela resolução de seus conflitos, articulados sob um sentimento de identidade, alteridade e pertença. Ante à litigiosidade incontida das relações humanas, urge a construção de caminhos que favoreçam a comunicação das partes em conflito, pois a ausência de consenso e de mecanismos não adversativos para a resolução dos conflitos não podem justificar o retorno à barbárie, onde vence o mais forte e, onde quem detém o poder, pune.

Orientar e prevenir para não ser necessário punir.
Construir estradas e não impor caminhos.